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junho 9, 2015

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“Em todo amor há pelo menos dois seres, cada qual a grande incógnita na equação do outro. É isso que faz o amor parecer um capricho do destino – aquele futuro estranho e misterioso, impossível de ser descrito antecipadamente, que deve ser realizado ou protelado, acelerado ou interrompido. Amar significa abrir-se ao destino, a mais sublime de todas as condições humanas, em que o medo se funde ao regozijo num amálgama irreversível. Abrir-se ao destino significa, em última instância, admitir a liberdade no ser: aquela liberdade que se incorpora no outro.”

Amor Líquido – Zygmunt Bauman

Dentro de um quarto

Pra ler ouvindo: You will always be free | Noora Noor

Não entendi o por quê. A gente tinha estabelecido aquela relação de comum acordo. Duas pessoas, dois corpos, duas vidas. Não fizemos promessas. Você nunca me deu essa chance, sempre tão sincero desde o início. Sempre falando daquela garota; aquela que você fazia questão de repetir que já não amava, mas estava com frequência no meio dos seus, dos nossos, assuntos.

Então, éramos amigos que transavam. Pra mim, um tipo completamente novo de relação. Eu me mantinha fechada sobre meu passado, minhas histórias e o que tinha me levado até você. Quando estava ali com você, numa mesa de bar, numa boate escura ou na cama do motel, estava ali com você.

Por isso, não consigo entender o por quê. Por que você fez aquela cena de ciúmes outro dia. Ou por que você começou a me bombardear de perguntas quando me viu com outro cara.

Não somos duas pessoas procurando a mesma coisa? Não estamos os dois em busca de alguém que possa nos amar como nós mesmos podemos amar? Não foi você que me disse, antes de contar que estava saindo com outra garota, que somos livres?

You will always be free… diz a música daquela cantora negra que você me mandou numa tarde modorrenta de trabalho.

Agora entendo o que você queria dizer quando brincava comigo; quando dizia que a gente era de mundos diferentes; quando dizia que eu era uma garotinha boba e rica da ZS e que você era o malandro da ZN, artista, criativo.

Sim, somos de mundos diferentes. Ainda que eu não saiba exatamente que mundo é o meu e você pareça tão seguro do seu. Nada a ver com nossas origens ou endereços nos comprovantes de residência. Somos de mundos diferentes, principalmente, porque não fizemos questão de juntá-los.

Parece triste, não parece? Me sinto triste.

E mesmo agora, quando a sanidade me deixa pensar com discernimento sobre a gente, não posso negar, houve beleza. Entre discussões e desentendimentos, houve beleza entre nós. Como quando dançamos juntos naquela rua estreita do centro do Rio, sob a luz da lua, entre boêmios, solitários e perdidos; ou como quando você me roubou um primeiro beijo, cheio de possibilidades.

Sim, existiu beleza. E, quem sabe, poderia ter existido amor.

Mas preferimos que houvesse apenas duas pessoas, duas vidas e dois corpos. Interligados somente pelo prazer que podiam dividir dentro de um quarto.

amor-liquido

ju.jpgJuliana Borel é aspirante a escritora e poeta. Pra ganhar dinheiro e pagar as contas é jornalista a maior parte da semana. Pra se inspirar gosta de ouvir Guns, trilhas sonoras e esbarrar por aí em pessoas interessantes. Seu blog procurasepoesia.blogspot.com.br é praticamente seu DNA.

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