Bebi água, em vão. O gosto amargo do dia anterior não sumiu. Deitada na cama não alcancei o copo de uísque que você deixou na cabeceira do lado oposto ao meu. Talvez uma bebida mais forte pudesse apagar o sabor daquela briga.

Me esforcei o quanto pude, mas não alcancei o uísque. A cama parecia infinita. A janela ao lado parecia a quilômetros de distancia. Voltei a olhar pro teto. O mesmo que presenciou tudo. Nos encaramos por um tempo, até ouvi-lo me acusando. Tapei os ouvidos, mas a voz de gesso ultrapassava a barreira e sussurrava “a culpa é sua”.

Eu não vou chorar. Há tempos cumpro minha promessa de não chorar por sua, por nossa, causa. Se tinha decidido ir embora, o melhor era que fosse. Não sentirei saudade. Quem poderia sentir saudade de você? Não. Não sentirei saudade. Nem dos beijos, nem daquele seu jeito de acariciar minha nuca, quando eu dormia de costas para você.

Quando conseguir levantar, pode ter certeza, vou pegar aquele seu caderno surrado e rasgar as poesias que fazia dizendo que eram pra mim. Quando esse teto parar de gritar, pode ter certeza, vou apagar cada vestígio seu. Vou lavar os lençois. Vou jogá-los fora e comprar novos. Quando a janela voltar pro lugar dela, pode ter certeza, vou jogar o que tiver sobrado de você por ela, esperando ver seu sangue espirrar por todo lado.

Mas, por enquanto, vou ficar deitada mais um pouco. Não pense que é por medo de me esquecer de você. É só porque o gosto amargo ainda não saiu da minha boca e a cama ainda não voltou ao tamanho normal. Não demora muito estaremos todos livres de você. E se o teto continuar berrando, mudo de casa, de estado, de País.

Sei que você não virá comigo.

uisque

ju.jpgJuliana Borel é aspirante a escritora e poeta. Pra ganhar dinheiro e pagar as contas é jornalista a maior parte da semana. Pra se inspirar gosta de ouvir Guns, trilhas sonoras e esbarrar por aí em pessoas interessantes. Seu blog procurasepoesia.blogspot.com.br é praticamente seu DNA.

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